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sexta-feira, 4 de setembro de 2015
Inadimplencia
Como se sabe, o setor bancário ficou marcado na década de 90 pela fragilidade dos processos de decisão de crédito. Não que os bancos, de modo geral, não soubessem conceder crédito – não seria correto fazer tal afirmação, pois essa é a essência da atividade bancária, e vem sendo realizada desde muito antes do surgimento, de forma estruturada, do primeiro banco, por volta de 1170, na Itália, La Banca de Venezia(1) –, mas porque as mudanças no ambiente econômico, promovidas por vários acontecimentos, tais como a globalização, a sofisticação do mercado de capitais, as inovações no campo da tecnologia de informação e vários outros, foram tão intensas, que alteraram significativamente o ambiente empresarial e o comportamento das empresas. Consequentemente, os modelos de avaliação de risco das empresas até então utilizados precisaram ser aperfeiçoados.
Diante deste cenário, vários países, orientados pelas recomendações do Bank for International Settlements (BIS), iniciaram o processo de reformulação de suas regulamentações relativas à atividade bancária, tendo como tônica a prudência (regulação prudencial) e os processos (controles internos), com o objetivo de aperfeiçoar e fortalecer a atividade bancária, particularmente a do processo de gestão do risco de crédito (principal atividade de um banco), e como principais pontos os critérios para provisionamento de perdas dos créditos concedidos.
O processo de provisionamento tem início com a mensuração da expectativa de um determinado cliente não liquidar o crédito no prazo esperado, passando, assim, a ser denominado inadimplente. A “mensuração da expectativa” é uma medida que reflete a probabilidade do evento de inadimplência ocorrer, atribuída de forma estatística ou julgamental. Varia de zero a 100% e pode ser convertida em uma classificação denominada “rating”, representada por um caractere alfa, caractere numérico ou caractere alfanumérico. Portanto, o rating informa a probabilidade de uma empresa não saldar o crédito obtido dentro do prazo esperado, isto é, a probabilidade de tornar-se inadimplente. Para as carteiras de small business e middle market, tendo em vista o grande número de empresas a serem avaliadas, os modelos estatísticos mostram-se mais adequados na medida em que proporcionam rapidez, segurança e qualidade nas decisões de crédito. Os modelos julgamentais são mais utilizados na mensuração do risco de empresas corporate, pois são poucas empresas, com operações de grandes volumes.
A mensuração do risco de crédito divide-se em três etapas:
• Risco do tomador do crédito (risco empresa ou rating da empresa);
• Risco da operação (risco operação ou rating da operação); e
• Risco de concentração da carteira (risco concentração ou risco carteira).
O objetivo desse trabalho é abordar alguns dos principais aspectos conceituais dos modelos estatísticos de mensuração do risco empresa, que é a base para a mensuração do risco operação e concentração.
Síntese da Regulamentação Brasileira
Em janeiro de 2000, o Banco Central do Brasil editou a Resolução 2.682, definindo critérios para provisionamento de créditos concedidos de acordo com a classificação de risco atribuída à operação (risco operação). Para tanto, instituiu nove classes de risco e para cada uma delas determinou um percentual para provisionamento, conforme tabela abaixo:
O percentual de provisionamento reflete a expectativa de perda da operação (risco operação), que, como foi dito anteriormente, tem como ponto de partida a mensuração do risco empresa. O Banco Central apenas criou as classes de risco e definiu o percentual de provisionamento para cada uma delas. No entanto, a mensuração do risco empresa (o ponto de partida) ficou a cargo de cada instituição, utilizando modelos desenvolvidos internamente (modelos próprios) ou modelos de mercado, como o Credit Rating® Serasa, disponibilizado para o mercado desde 1999.
Independentemente do modelo a ser adotado pela instituição (próprio ou de mercado), há alguns aspectos no processo de desenvolvimento de modelos que merecem ser observados, quais sejam:
• Objetivo do modelo;
• Diferentes tipos de empresas (porte e setor de atividade);
• Quantidade de classes de risco;
• Distribuição dos intervalos de probabilidade nas classes de risco.
Objetivo do Modelo
Inicialmente, cabe ressaltar, mais uma vez, a natureza estatística dos modelos, ou seja, tratam-se de modelos probabilísticos. Portanto, propõem-se a medir a probabilidade de um determinado evento ocorrer. Probabilidade essa representada por uma classe de risco, o rating. O termo rating significa “classificação” e, para classificar algo, é preciso definir o “critério” da classificação, ou seja, o objetivo do modelo. Os eventos em questão são inadimplência e insolvência, portanto, o rating reflete a probabilidade de uma determinada empresa incorrer em pelo menos um desses eventos, em um determinado horizonte de tempo.
Convém ressaltar a diferença entre inadimplência e insolvência. Enquanto insolvência tem um caráter de incapacidade de uma empresa liquidar seu passivo, traduzido pelos eventos de concordata e falência, a inadimplência é entendida como um conjunto de eventos, considerados graves, que podem levar uma empresa à situação de insolvência. Esse conjunto de eventos abrange desde apontamentos negativos como protestos, cheques sem fundos, ações executivas, até a situação de dívida atrasada por um determinado período de tempo.
Enquanto o conceito de insolvência, traduzido pelos eventos de concordata e falência, é claramente entendido por todos, o de inadimplência não, pois está ligado à cultura de crédito de cada instituição.
No desenvolvimento de um modelo, é importante definir claramente o que se entende por “empresa inadimplente”. Essa etapa é de extrema importância, pois define o objetivo do modelo, estabelecendo o evento que será o objeto de mensuração da probabilidade de ocorrência. É na definição do conceito de inadimplência que começam as diferenças entre os modelos. Se uma determinada instituição, ao desenvolver seu modelo, definir que “inadimplente” é a empresa que não paga o crédito que tomou na data do vencimento, e outra instituição definir que inadimplente é a empresa que atrasa o pagamento por mais de 30 dias, os modelos dessas instituições poderão atribuir ratings diferentes para uma mesma empresa. Por exemplo, uma empresa que possui um crédito atrasado há 10 dias para um modelo será considerada inadimplente, pois não quitou a operação na data do vencimento, porém, para o outro modelo, não será considerada inadimplente, pois ainda não atingiu 30 dias de atraso.
A definição do objetivo do modelo é um importante diferencial competitivo, pois quanto mais um modelo discriminar os riscos dos clientes, melhores taxas poderão ser oferecidas, além de incorrerem em menores perdas. Por outro lado, deve-se ficar atento ao comparar os diferentes ratings atribuídos a uma mesma empresa, pois os modelos utilizados para atribuição dos ratings podem ter objetivos diferentes.
No processo de desenvolvimento de um modelo, o conceito de inadimplência é importante para estabelecer o objeto de mensuração da probabilidade de ocorrência, e é utilizado também para a seleção da amostra de empresas. Do ponto de vista da modelagem estatística, é importante que a amostra tenha a mesma quantidade de empresas inadimplentes e não-inadimplentes. Se, durante o desenvolvimento do modelo houver mudança do conceito de inadimplência, todo o trabalho deve ser refeito, pois algumas empresas da amostra selecionada anteriormente poderão sofrer alteração na classificação de inadimplente e não-inadimplente.
Na questão da definição do “objetivo” do modelo cabe a seguinte pergunta: por que o modelo deve se propor a medir a probabilidade de inadimplência? Não bastaria medir apenas a probabilidade de ocorrência da insolvência? Como foi mencionado anteriormente, a insolvência tem um caráter de incapacidade da empresa liquidar seus passivos, deixando, assim, pouquíssima margem de ação para o gestor do crédito. Identificando e mensurando a probabilidade de ocorrência de eventos graves que podem levar uma empresa ao estado de insolvência, o gestor do crédito terá condições de administrar mais adequadamente sua carteira, evitando os custos de cobrança, execução e perdas definitivas.
A definição dos “eventos graves”, que caracterizarão a empresa como inadimplente, é o que torna mais interessante a construção de modelos.
A Questão Porte e Setor de Atuação da Empresa
Outro aspecto de extrema relevância para a definição do conceito de inadimplência é o porte da empresa. Enquanto eventos como cheque devolvido, protestos e ações executivas podem ser considerados “eventos graves” para uma empresa pequena (características que a definem como inadimplente), para empresas de grande porte esses eventos podem não ser significativos.
Dessa forma, se o conceito de inadimplência, que é a base de desenvolvimento de um modelo (seu objetivo), pode ser diferente para cada porte de empresa, significa então que deverão ser desenvolvidos modelos específicos para cada porte.
Além do porte, há também a questão do setor de atividade. É necessário investigar estatisticamente se, por exemplo, as empresas de um determinado porte do setor industrial têm as mesmas características das empresas do setor comercial, de serviços ou primário. Os modelos desenvolvidos pela Serasa foram segmentados por porte (small, middle e corporate) e cada porte foi dividido por setor da economia (indústria, comércio, serviços e primário), porque os estudos estatísticos indicaram perfis diferentes para cada porte/setor em relação aos conceitos de inadimplência.
Na comparação dos diferentes ratings atribuídos a uma mesma empresa, além do conceito de inadimplência (objetivo do modelo), a questão da definição de porte é um ponto também a ser observado, pois, dependendo do critério adotado, uma empresa pode ser classificada como pequena em um modelo e média em outro.
Embora no mercado exista um consenso (subjetivo) sobre as classificações de micro, pequena, média e grande empresa, não há uniformidade quanto aos parâmetros utilizados. Verifica-se certa uniformidade na utilização do Faturamento Líquido Anual como parâmetro para definição de porte, porém, não é possível afirmar o mesmo quanto à definição do montante de faturamento que caracteriza cada porte.
No caso de microempresas a situação é ainda mais complexa, pois a definição de porte confunde-se com as diversas definições de ordem tributária. O Estatuto da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte, Lei 9.841, estabelece, no artigo 2º, que microempresa é aquela que tem faturamento anual até R$ 244 mil e empresa de pequeno porte, até R$ 1.200 mil. A legislação do Imposto de Renda, Lei 9.718/98, em seu artigo 14, não permite a utilização do parâmetro de Lucro Presumido, para fins de cálculo do imposto de renda, pelas empresas com faturamento anual superior a R$ 24 milhões. E, para efeito do Imposto Simplificado (SIMPLES) (IN SRF 09/99) (2), considera-se microempresa aquela que tem faturamento anual até R$ 120 mil e empresa de pequeno porte, até R$ 1.200 mil.
Outro aspecto que dificulta a atribuição de porte microempresa é a falta de informação precisa, consistente e confiável sobre o faturamento dessas empresas. A grande maioria não possui processo estruturado de contabilização de suas operações, havendo necessidade de se buscar outros referenciais de grandeza para classificação de microempresa, como, por exemplo, o valor do Capital Social. É necessário esse procedimento (adoção de outro parâmetro) para que as grandes empresas, que por algum motivo não divulgam seus balanços, não sejam classificadas indevidamente como microempresas. Esse erro poderá ocorrer caso sejam tomadas decisões simplistas do tipo: “se não tem balanço, é microempresa”. Portanto, na ausência de informação sobre faturamento, é recomendável a utilização de um parâmetro alternativo, como o valor do Capital Social, montante de compras ou pagamentos realizados no mercado, que são informações objetivas e permitem a definição do porte das empresas.
Classes de Risco
O resultado final do desenvolvimento do modelo, dependendo da ferramenta estatística utilizada, é uma função que envolve uma constante (b0) e as variáveis selecionadas estatisticamente com seus respectivos pesos (b1.x1 + b2.x2 +... + bn.xn). A partir dessa função, chega-se a um percentual que varia de zero a 100%, que indica a probabilidade da empresa se tornar inadimplente, em um determinado horizonte de tempo. Para simplificar a linguagem vamos chamar essa probabilidade de Probabilidade de Inadimplência (PRINAD).
É preciso, então, definir a forma ou linguagem que será utilizada para expressar o rating. Em outras palavras, é preciso definir as classes de risco e as faixas de PRINAD de cada uma delas. Esse é também um ponto importante que pode influenciar o resultado de todo o processo de gestão do crédito, ou seja, pode ser mais um diferencial competitivo.
O primeiro passo é definir a quantidade de classes de risco. Podem ser criadas tantas classes quanto o gestor de crédito achar necessário, tendo presente que um número maior de classes permite melhor distinção dos riscos das empresas, o que, consequentemente, possibilita a definição de políticas de crédito mais adequadas e aumenta o poder de competitividade da Instituição no mercado.
No exemplo acima, a instituição “B” distingue melhor as empresas que a instituição “A”. Por possuir mais classes de risco, tem melhor visão dos riscos das empresas, consequentemente, poderá desenvolver melhores abordagens para os clientes. Após a criação das classes, o passo seguinte é atribuir o risco que cada uma representará, determinando um intervalo de Prinad para cada classe de risco. Assim, o rating passa a ter significado. Veja exemplo abaixo:
A distribuição dos intervalos de PRINAD é outro ponto que merece atenção. Mesmo que duas ou mais instituições possuam a mesma quantidade de classes de risco em suas tabelas, cada instituição poderá ter definido diferentes intervalos de PRINAD para cada classe. Assim, uma determinada empresa poderá ser classificada com rating 3, por exemplo, por essas instituições, mas, para cada uma, o rating 3 terá significados (intervalos de PRINAD) diferentes.
Observe que a amplitude dos intervalos de PRINAD, assim como a Prinad média, aumenta significativamente nas últimas classes (6, 7 e 8). A distribuição das probabilidades pelas classes de risco deve levar em consideração a política de crédito de cada instituição, o chamado “apetite ao risco”, bem como, o impacto das “expectativas de perdas” na rentabilidade da carteira. Imagine, por exemplo, um montante de crédito de $ 100 emprestados a uma taxa de 2% a empresas com rating 5 da tabela acima, cuja expectativa média de perda (Prinad média) é de 5%. Ao invés de uma rentabilidade de 2%, essa instituição terá um prejuízo de 3% (juros esperados de $ 2 menos a perda esperada de $ 5).
O exemplo foi apresentado de forma bastante simples, apenas para dar uma idéia do impacto das expectativas de perda na rentabilidade da carteira e para justificar a lógica da distribuição dos intervalos de Prinad nas classes de risco. Não foram consideradas a transformação do risco empresa em risco operação e nem a metodologia de precificação do crédito ajustado ao risco da operação.
Outro aspecto importante a ser observado, também, é que as faixas de PRINAD têm comportamento exponencial, enquanto as classes de risco se comportam linearmente. Como pode ser observado na tabela de distribuição das PRINADs, nas classes de risco apresentadas anteriormente, a mudança de um ponto, de 6 para 7, significa um aumento da probabilidade de inadimplência de quase 3 vezes (de 7,50% para 16,75%).
Considerações Finais
Procuramos destacar, neste artigo, as principais características dos modelos de atribuição de rating, que, por um lado, podem ser diferenciais competitivos entre as instituições financeiras e, por outro, devem ser observadas quando uma mesma empresa for classificada de forma diferente pelas instituições financeiras. Antes de se comparar ratings atribuídos a uma mesma empresa, é preciso observar os objetivos dos modelos, o que se propõe para medir a probabilidade de ocorrência, quais modelos (do ponto de vista do porte das empresas) foram utilizados (conceito de porte), a quantidade de classes de risco e os intervalos de Prinad de cada classe.
É pouco provável que dois modelos atribuam a mesma probabilidade de inadimplência (prinad) para uma mesma empresa. Mesmo tendo todas as conceituações iguais, a base de dados utilizada para o desenvolvimento de cada um deles é diferente. Embora as probabilidades de inadimplência sejam diferentes, pode ser atribuído o mesmo rating (AA, B, 1, 2, 3, etc.), devido às Prinads se situarem nos mesmos intervalos.
É importante destacar, também, a utilização de diferentes tipos de variáveis: cadastrais, financeiras, negativas, positivas, etc. Dessa forma, aspectos críticos de sucesso ou insucesso de uma empresa, que não são refletidos em números contábeis, podem ser contemplados nos modelos por meio de outras variáveis, além do que, cabe ressaltar que variáveis financeiras têm pouca influência em modelos para microempresas.
Um outro aspecto que torna cada modelo único é o trabalho estatístico das variáveis durante o desenvolvimento do modelo. Estudar a melhor forma de utilizá-las é a “arte” da modelagem de risco. Qual a melhor forma de segmentar a variável “idade da empresa”? De zero a um ano, dois, três anos? Será que uma variável terá a mesma segmentação em cada porte/setor? Quanto melhor a forma de utilizar a variável, melhor pode ser o resultado final do modelo.
Pelos motivos expostos, o modelo de classificação do risco é, sem dúvida, o aspecto mais importante no processo de gestão de crédito, pois influencia a precificação dos empréstimos, o provisionamento de risco e a alocação de capital econômico.
Notas
1 COLLI, José Alexandre e FONTANA, Marino. Contabilidade Bancária. 5 ed., São Paulo, Atlas, 1994. P. 15.
2 Instrução Normativa da Secretaria da Receita Federal publicada no Diário Oficial da União de 12/02/1999.
Olavo Borges é Gerente do Departamento de Desenvolvimento Técnico de Crédito da SERASA e Mestre em Controladoria pela USP.
http://www.serasaexperian.com.br/serasaexperian/publicacoes/revistas/2001/24/revista_0133.htm
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